Entre Gente e Silêncio
Neide Rodrigues
Nasci e cresci no interior, onde o verde era o pano de fundo da vida.
Campos vastos, canto de pássaros, rios de águas claras — era ali que a minha alma se moldava.
A terra era fértil como o coração da minha mãe, sempre pronta a acolher.
Nossa casa, simples, sem água canalizada nem luz elétrica, tinha o brilho das árvores frutíferas o ano inteiro e da bondade sem medida.
Andei quilômetros a pé, muitas vezes sozinha, noite adentro, buscando o ensino médio que parecia tão longe quanto os sonhos.
O caminho era escuro, mas minha vontade era mais forte que qualquer ausência de luz.
E ali, entre passos e esperança, aprendi a persistir.
Nossa casa vivia cheia.
Políticos, amigos do meu pai, vizinhos das partes mais baixas da cidade que, nas enchentes, subiam em busca de abrigo.
Minha mãe, sempre de sorriso aberto e mãos incansáveis, fazia do nosso lar um porto seguro.
Meu pai, um verdadeiro gentleman — desses que hoje são raridade — era a firmeza serena que nos guiava.
Cresci entre muitos, e por isso conheci muita gente.
Gente da cidade, das beiras do rio, da praça e da feira.
Mas não fiz amigos afins.
Talvez porque o afeto que se vê todos os dias — aquele que se convida pra um café ou se visita sem motivo —
esse tipo de aconchego nunca foi duradouro pra mim.
Talvez eu tenha aprendido cedo demais a viver entre pessoas, mas sem me demorar em ninguém.
Conheço muitos rostos, mas poucos olhares ficaram.
E às vezes, mesmo cercada de lembranças, sinto falta de alguém que me leia sem eu precisar dizer.
Mas sigo...
Com o coração plantado naquela terra de infância, onde a ausência também faz brotar flores.
Natal, 14 de maio de 2025.
Minhas memórias