O Fandango da Minha Terra
Era eu ainda menina, de olhar curioso e coração leve, quando assisti ao fandango pela última vez. A dança, com seus passos firmes e compassados, parecia trazer ao palco um pedaço da alma de minha terra. Naquele tempo, pouco entendia da grandiosidade que ali se apresentava. Para mim, era apenas uma festa, um momento de música e alegria, onde a tradição veste branco e se transforma na Nau Catarineta. Os movimentos precisos desenhavam no ar um espetáculo que prendia a atenção de todos.
A Nau Catarineta não é apenas um barco; é o coração pulsante do fandango, um símbolo da perseverança de um povo que se mantém firme, enfrentando as tempestades do tempo. Seus versos e sua coreografia narram histórias de coragem, de lutas e de vitórias, preservando a essência de nossa cultura.
Os anos se passaram e, com eles, o ritmo da vida me levou por outros caminhos. Cresci, deixei minha cidade natal e, sem perceber, aquela última apresentação ficou marcada como um ponto final em minha convivência com o fandango. Não sabia, na época, que aquela noite ficaria gravada em minha memória como um misto de nostalgia e encanto que, vez ou outra, surge como um suspiro de saudade.
Hoje, ao saber que o fandango ainda resiste ao tempo, meu coração se enche de alegria. Saber que ele continua a se apresentar na festa da padroeira me faz sentir conectada às minhas raízes. É como se a terra em que nasci me enviasse uma mensagem: "Ainda estamos aqui, dançando para você." Imagino as noites iluminadas, a praça repleta de gente, e os dançarinos trazendo, em cada gesto, o peso e a leveza de uma tradição que se recusa a ser esquecida.
Sinto vontade de voltar, de me sentar novamente no banco da praça, agora com os olhos mais atentos e um coração repleto de gratidão. Quero aplaudir o fandango como quem agradece por ele ainda existir, por ser uma ponte que me liga à menina que fui e à cultura que me moldou.
O fandango não é apenas uma dança; é história viva, é resistência, é poesia em movimento. É a voz de um povo que se recusa a esquecer suas raízes, dançando a sua história sob o brilho das estrelas. Enquanto ele pulsar nos pés dos dançarinos e no compasso das violas, sei que minha terra continuará viva em mim.
Neide Rodrigues,09 de dezembro de 2024.